30.12.12

A meditação sobre o Tietê

O Rio Tietê nasce a 22 km do Oceano Atlântico percorre mais de 1.000 km e junta-se a Bacia do Prata... Magnífico!...

"Água do meu Tietê,
Onde me queres levar?
- Rio que entras pela terra
E que me afastas do mar…
É noite. E tudo é noite. Debaixo do
arco admirável
Da Ponte das Bandeiras o rio
Murmura num banzeiro de água
pesada e oleosa.
É noite e tudo é noite. Uma ronda
de sombras,
Soturnas sombras, enchem de noite
tão vasta
O peito do rio, que é como si a
noite fosse água,
Água noturna, noite líquida,
afogando de apreensões
As altas torres do meu coração
exausto. De repente
O óleo das águas recolhe em cheio
luzes trêmulas,
É um susto. E num momento o rio
Esplende em luzes inumeráveis,
lares, palácios e ruas,
Ruas, ruas, por onde os
dinossauros caxingam
Agora, arranha-céus valentes donde
saltam
Os bichos blau e os punidores
gatos verdes,
Em cênticos, em prazeres, em
trabalhos e fábricas,
Luzes e glória. É a cidade… É a
emaranhada forma
Humana corrupta da vida que muge
e aplaude.
E se aclama e se falsifica e se
esconde. E deslumbra.
Mas é um momento só. Logo o rio
escurece de novo,
Está negro. As águas oleosas e
pesadas se aplacam
Num gemido. Flor. Tristeza que
timbra um caminho de morte.
É noite. E tudo é noite. E o meu
coração devastado
É um rumor de germes insalubres
pela noite insone e humana.
Meu rio, meu Tietê, onde me
levas?
Sarcástico rio que contradizes o
curso das águas
E te afastas do mar e te adentras
na terra dos homens,
Onde me queres levar?…
Por que me proíbes assim praias e
mar, por que
Me impedes a fama das
tempestades do Atlântico
E os lindos versos que falam em
partir e nunca mais voltar?
Rio que fazes terra, húmus da
terra, bicho da terra,
Me induzindo com a tua insistência
turrona paulista
Para as tempestades humanas da
vida, rio meu rio!…
[…]" (Mário de Andrade)

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